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Posts tagged as “CRÒNICA DE ADEMAR RAFAEL”

Crônica de Ademar Rafael

O DEVER DE CASA

Se existe uma coisa sobre a qual eu não tenho dúvida é que a convivência harmônica entre a produção e a preservação do meio ambiente tem pouco da situação econômica ou financeira dos envolvidos e tem muito da
noção exata de cidadania e do pensamento coletivo.

Conheci em Barra do Choça – BA um pequeno agricultor, graduado em agronomia com muito esforço pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB, provedor de família digna com a renda de uma pequena
propriedade onde cultivava café na sombra, milho, feijão, mandioca, forragem para gado de leite, aplicava a técnica sustentável de corte seletivo de madeira nobre e criava pequenos animais e peixes.

Testemunhei na Amazônia a nociva pratica de colonos que ao receberem um lote em assentamento do INCRA a primeira coisa que faziam era retirar a madeira, inclusive de castanheiras, para vender por preço de banana. Outros vendiam hastes do açaí para retirada do palmito, também por preço aviltado. Cabe registrar que a maioria dos colonos criticavam o procedimento inadequado dos seus pares e preservaram seus lotes.

A revista época negócios de março-2020, na série de reportagem sob o título “Capitalismo em transe”, apresenta estudo do grupo canadense Corporate Knights com base em dados de sete mil organizações mundiais sobre sessenta e cinco indicadores ambientais, sociais e econômicos. As duas empresas classificadas como mais sustentáveis no mundo são da Dinamarca. A primeira é a Osted A/S, do setor de energia; a segunda é a Chr. Hansen Holding A/S, do setor de alimentos. A terceira colocada é a Neste Oyj, do setor de petróleo da Finlândia.

Cabe registrar que a Dinamarca começou investir em energia eólica nos anos 1970, nós estamos pensando em tributar o setor. Sim, o Banco do Brasil aparece na nona posição, a Cemig em décima nona e a Natura em
trigésima. A convivência harmônica é possível? Decida.

Crônica de Ademar Rafael

NÃO VOU SAIR

Por: Ademar Rafael

Na época do regime instalado no Brasil após movimento de 1964, que cada um denomina como melhor lhe convém, o slogan “Brasil, ame-o ou deixe-o” era repetido e estampado todo momento.

Hoje, no auge dos meus 63 anos, tenho uma percepção que muito foram amando o Brasil e outros tantos ficaram sem amar a pátria. O resultado é este país que temos, onde “patriotas” traem os interesses de nação e “traidores” defendem até a morte atitudes que agregam valores as causas nacionais.

A música e a poesias são dois dos poucos remédios, sem custo, que reduzem os impactos que as dualidades acima mencionadas causam em mentes de pessoas do bem.

Neste sentido transcrevo na íntegra a letra de uma música do final dos anos 1980, da lavra de Celso Viáfora, intitulada “Não vou sair”: “A geração da gente/Não teve muita chance/De se afirmar, de arrasar, de ser feliz/Sem nada pela frente pintou aquele lance/De se mudar, de se mandar desse país/E aí você partiu pro Canadá/E eu fiquei no ‘já vou já’/ Pois quando tava me arrumando/Pra ir/Bati com os olhos no luar/E a lua foi bater no mar/E eu fui que fui ficando… – Distante tantas milhas/São tristes os invernos/Não vou sair, tá mal aqui, mas vai mudar/Os velhos de Brasília/Não podem ser eternos/Pior que foi, pior que está, não vai ficar/Não vou sair/Melhor você voltar pra cá/Não vou deixar esse lugar/Pois quando tava me arrumando/Pra ir/Bati com os olhos no luar/E a lua foi bater no mar/E eu fui que fui ficando…”

Como é real a letra de “Não vou sair”. Omissos nos agarramos na beleza do luar, no mar, na esperança que as coisas vão melhorar, na renovação dos “velhos de Brasília”. Ficando e agindo individualmente, esquecendo o Brasil nada muda. Vamos decidir verdadeiramente: “Amar ou deixar”?

Crônica de Ademar Rafael

A MÚSICA DA MINHA INFÂNCIA

Por: Ademar Rafael

Um dos meus vícios é ouvir rádio, aprendi com meu saudoso pai na época que morávamos na Quixaba – Jabitacá – PE. Era sagrado ouvirmos cantorias na Borborema de Campina Grande – PB, Espinharas de Patos – PB e Pajeú de Afogados da Ingazeira – PE. Na calçada da casa onde nasci os moradores ficavam em silêncio para ouvir a “Voz do Brasil” e outros programas que meu pai sintonizava no velho ABC, “A voz de Ouro”.

Na época que deixei meu sertão para andar pelo Brasil, na condição de funcionário do Banco do Brasil perdi o contato com tais emissoras, no entanto, o Programa “Adelzon Alves o amigo da madrugada”, na Rádio Globo – Rio de Janeiro –RJ foi meu companheiro muitas noites.

Quando voltei para o nordeste em 2015, já com o advento da internet, voltei a ouvir regularmente a Rádio Pajeú. Recentemente da inquietude poética de Alexandre Morais fez nascer o “Palco Pajeú”, programa que tive a honra de participar no último sábado de 2019.

É o que de melhor apareceu nos últimos anos. A quarentena da COVID-19 não interrompeu sua apresentação, Alexandre Morais e Ney Gomes se viram nos 120 – a atração tem duas horas de duração – para levar aos ouvintes o “Palco Pajeú”.

O programa de 24.04.20 trouxe como tema “A música de minha infância”. Ao sintonizar a Rádio Pajeú 99,3 naquela tarde de sábado rodou um filme em minha memória para resgatar a música da minha infância. Foi fácil localizar não apenas uma, mas, três: “Coração de Luto”, de Teixeirinha; “Serrote Agudo”, de Luiz Gonzaga e Zé Marcolino e “Índia”, de Manuel Ortiz Guerrero e José Asunción Flores, versão de José Fortuna e imortalizada nas vozes de Cascatinha & Inhana.

Hoje, cinquenta anos depois, tenho certeza que em um filme sobre minha vida as três músicas acima estariam na trilha sonora.

Crônica de Ademar Rafael

OUVINDO SEMPRE

Por: Ademar Rafael

Ouvir os consumidores dos seus produtos e os usuários dos seus serviços é uma prática que muitos deixam de lado e com isto perdem espaço e somem do mercado.

Tenho o hábito de consultar meus leitores e minhas leitoras através do “facebook”. Por tal aplicativo recebo avaliações positivas e negativas. Outro método que utilizo é ouvir pessoalmente meu público. Em uma dessas conversas ouvi do amigo Marcos Cocada um pedido da fazer crônicas sobre pessoas de nossa região. Passei a dedicar a última crônica de cada mês para este grupo e a receptividade tem sido boa.

Na segunda quinzena de maio recebi um recado do leitor assíduo e grande amigo Pedro Alves, humanista, médico e vive-prefeito de Iguaraci.O que disse o filho de Sebastião da Farmácia? “Ademar direcione suas crônicas para nossa região, você algumas vezes escreve sobre temas distantes da nossa realidade”. Os pedidos do Dr. Pedro e de Marcos são ponderações corretas e merecem toda atenção. Desta forma ao escrever doravante vou lembrar que o propósito deste espaço é criar um ambiente com estreita compatibilidade com nossas origens.

A grande maioria dos assuntos sobre os quais escrevo são inspirados em leituras que faço ou em observações nas áreas em que estou atuando. Não gosto de escrever sobre personalidades. Prefiro uma abordagem sobre processos e comportamentos, que promovam reflexões. Contudo, levarei em consideração as observações do amigo Pedro Alves.

Ao particularizar corremos o risco de cometer atos falhos. Certa vez escrevi uma crônica sobre Manoel Jerônimo. Recebi um telefonema de um dos seus filhos que agradeceu a homenagem, mas, disse-me: “Ademar, papai está vivo”.  Eu havia escrito que nosso sindicalista havia falecido. Com redobrada atenção continuarei ouvindo sempre, provocando reflexões e diversificando dentro de limites aceitáveis.

Crônica de Ademar Rafael

JOSÉ GOMES DO AMARAL

Novamente recorremos ao livro do poeta egipsiense Antônio José de Lima “Legado filosófico de poetas e repentistas semi-analfabetos”, que assim qualifica Zezé Lulu; “… analfabeto confesso, porém, tinha a clareza da força divina que habitava o seu ser, quer fosse às ações, na humildade e, principalmente, nos repentes nas cantorias de pé de parede ou nas rodas de glosas.” Do mesmo exemplar extraímos esta pérola de sextilha: “Essa palavra ciência/Deus a mim não concedeu/A minha mão não escreve/Minha boca nunca leu/Mas, vivo estudando os livros/Que natureza me deu.”

Para este cronista Zezé Lulu era a exata figura do cantador de raiz, aquele que se reveste somente da inspiração para fazer seus versos. Tudo seu era natural, o sentido artificial das cosias não alcançou o poeta que nasceu no mesmo Sítio Serrinha onde recentemente faleceu Valdir Teles. Zezé Lulu, mesmo carregando a humildade que fala Antônio José de Lima, transitou pelo meio de todas as feras do repente sem envergonhar a classe. Cantando com quem quer que fosse ele era ele mesmo. Não maquiava nada para agradar, suas criações tinham uma marca própria.

Ainda Terezinha Costa, no livro “São José do Egito – Musa da poesia”, narra estas duas magistrais sextilhas de Zezé Lulu: “Eu admiro a aranha/Pela casa que constrói/Cavar no chá um buraco/Pra que aquele lhe apóie/ Botar-lhe mais uma tampa/Que nem a chuva destrói” e “Em cima de um pé de uva/O canário e o vem-vem/E a rolinha saudosa/Pousa prá cantar também/E o concriz canta olhando/As cores que a pena tem”.

Luís Wilson, em “Roteiro de velhos cantadores e poetas populares do sertão” nos traz esta sextilha de Zezé Lulu, falando sobre sua filha: “Já está chegando a hora/Da minha linda ‘galega’/Sair lá pelo terreiros/Dando ração a borrega/E perguntando: ‘Mamãe/Quando é que papai chega’?”

Adaptado da crônica “Pessoas do meu sertão XXIV” publicada em www.afogadosdaingazeira.com.br