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Crônica de Ademar Rafael

Heróis de Verdade

Lendo uma matéria sobre os 60 anos de Brasília, publicada no Almanaque Aparecida 2020 “Ecos Mariano” assinada por Daniel Siqueira, deparei-me com o texto a seguir transcrito: “A nova capital foi totalmente planejada.
Houve um concurso para escolher seu projeto e o escolhido foi do arquiteto Lúcio Costa. As principais construções da cidade ficaram a cargo do arquiteto Oscar Niemeyer e do engenheiro estrutural Joaquim Cardoso.”

O protagonismo e o brilhantismo de Oscar Niemeyer elevam seu nome sem excluir os nomes dos parceiros. Em muitas narrativas e nos registros sobre a Capital Federal o trio é mencionado. Isto, contudo, não é a regra é a exceção. Os nomes dos verdadeiros heróis muitas vezes são ignorados em favor da citação de outros atores cujos papeis foram secundários.

Durante a pandemia do coronavírus classifico como “heróis de verdade”: Socorristas, motoristas, maqueiros, auxiliares de enfermagem, enfermeiros, fisioterapêuticos, auxiliares de laboratórios, farmacêuticos, biomédicos, médicos, cientistas e outros profissionais da linha de frente que atuaram nos hospitais, nos laboratórios, nos centros de pesquisa, nas funerárias, coleta de lixo e vendas de alimentos.

Impossível também ignorar a importância dos operários que atuaram nas ampliações e adaptações das estruturas hospitalares existentes, na construção de hospitais de campanha e distribuição de alimentos.

A história, sempre escritas pelos vencedores, prefere jogar os holofotes sobre personagens escolhidos em processos seletivos que trazem à relevo muitos que não merecem. Está na hora de invertermos essa prática para não permitir que nos registros históricos sobre a COVID-19 sejam destacados nomes de autoridades, ou de laboratórios que não merecem sequer serem citados em virtude de omissão e interesses políticos e financeiros.

Crônica de Ademar Rafael

FELIZARDO MOURA NUNES

Na época que Felizardo enfrentou um tratamento de saúde o amigo Danizete enviou-me uma quadra que Zé de Cazuza – uma das mais ricas memórias do Nordeste, poeta fenomenal que nos brindou com o livro “Poetas Encantadores”, cujo conteúdo além da sua magnífica obra cita criações de vários outros poetas – fez após a recuperação do filho.

Eis a obra prima: “O Deus que aos astros deu brilho/Fez vista grossa aos meus erros/Prá evitar três enterros/Do pai, da mãe e do filho.” É sem sombra de dúvida uma belíssima criação, prova que na angústia e no sofrimento o poeta se multiplica.

Felizardo é para este cronista o Rolando Boldrin do Sertão. Um festival de violeiros apresentado pelo poeta da Prata tem outra roupagem. Com estilo próprio, em segundos relata versos e pequena biografia dos artistas. Este método cria uma espiral energética que além de envolver os presentes, inspira os poetas. Cada vez que encontro Felizardo Moura  volto com um novo estoque de versos e causos.

O potencial nato de Felizardo foi aperfeiçoado não apenas com o talento do pai, foi moldado com o que ouviu de Pinto, Zé Marcolino, Lino Pedra Azul, Manoel Xudu, João Furiba, Geraldo Amâncio, Manoel Filó, dos irmãos Batista: Louro, Otacílio e Dimas e tantos outros magistrais poetas. Tenho certeza que Joselito Nunes e tantos outros escritores que narram histórias e “estórias” do sertão buscam matéria prima para seus livros.

Sua inspiração tem como principal insumo a região que nasceu. Naquele terreno até a queda de uma folha tem métrica, o choque dos cascos dos animais nas pedras tem ritmo de um martelo alagoano e o barulho da chuva no telhado da casa sede da Fazenda São Francisco segue a cadência de um sete linhas na toada de Canhotinho. Da mesma fonte bebem os irmãos Luis Homero e Miguel Marcondes, artistas que deram de presente ao Brasil as obras inseridas no álbum “Vates & Violas” – Tudo que é bom, presta”, além de outras gravadas com grandes vozes, dentre as
quais destacamos Val Patriota.

Recentemente, após assistir a partida em que o Afogados – Coruja do Sertão – triturou o Atlético Mineiro, fez o mote “A coruja atrevida do sertão/Fez história na Copa do Brasil”. Vários poetas glosaram sua criação e as estrofes correram o mundo da mesma forma que as reportagens sobre a eliminação do galo mineiro.

Muitos amigos acalentem o sonho de vê-lo como principal gestor público da cidade da Prata – PB. Caso seja para seu bem, para o bem povo e bem da cultura, que aconteça logo.

Adaptada da crônica Pessoas do meu sertão XXVI, publicada em www.afogadosdaingazeira.com.br.

Crônica de Ademar Rafael

A CULPA É DE QUEM FAZ.

O secular jornal A UNIÃO de João Pessoa – PB publicou um encarte sob o título “Pensar”, convocando seus leitores e suas leitoras a fazerem uma profunda reflexão sobre nove temas: Direito humano, Ecumenismo, Feminismo, Suicídio, Democracia, Longevidade, Preconceito, Sustentabilidade e Ideologia. Nesta crônica quero falar um pouco sobre o último tema sugerido pelo jornal paraibano.

O encarte traz importantes informações sobre a palavra “Ideologia”. Assegura que ela foi inventada no século XVIII por Destutt de Tracy, filósofo francês. Seria para ele “… uma ciência dentro do ramo da Ciência da Natureza, que teria como objetivo tentar entender e explicar a origem das idéias.” Cita, também, a apropriação do termo por Karl Marx e por Friedrich Engels.

Em nosso país o termo tem sido sacrificado nos últimos anos para justificar atos de personalidades que enxergam traços ideológicos em tudo. Cada um, ao seu modo e na defesa dos seus interesses, reiteradamente afirma: “Em órgão ‘x’ tem apenas ideologia”, “A ideologia está acabando com instituição ‘y’” e “Temos que resgatar a entidade ‘z’
da ideologia e devolvê-los ao povo brasileiro”.

Para ficar bem claro e sem nenhuma sombra de dúvida o Brasil foi, é e será uma nação conservadora. Isto faz parte do seu DNA. Os “Donos do poder”, na concepção traçada por Raimundo Faoro sempre encontram uma brecha para manter seus privilégios em governos de direita, de centro ou de esquerda. Movem-se em velocidade supersônica e sugam até a última gota.

Os atos praticados por Hitler, Stalin, Mao e pela linha dura do movimento que derrubou Jango do poder em 1964 nada tem haver com ideologia, tem compatibilidade com a mente e o coração de quem os praticou. Que tal cada um assumir seus atos e deixar a “ideologia” quieta?

Crônica de Ademar Rafael

VAMOS DAR UMA PARADA?

Que fique bem claro: “O propósito deste texto não é criticar ninguém, julgar benefícios de produtos ou interferir na educação de crianças, é, acima de tudo fazer uma reflexão sobre os excessos”.

Augusto Cury, escritor e médico psiquiatra, em entrevista concedida para Revista Família Cristã de maio-20 ao responder uma pergunta sobre a Síndrome do Pensamento Acelerado – SPA, disse: “A Síndrome do Pensamento Acelerado é causada pelo excesso de informações que vêm das mídias sociais, dos smartphones, da TV, bem como do excesso de atividades e de videogames. Uma das teses que tenho levantado em minhas conferências para juízes é de que as crianças vivem uma espécie de cárcere mental” e conclui: “O gatilho cerebral dispara freneticamente diante de cada estímulo das telas de Smartphone, abrindo milhares de arquivos ou janelas no córtex cerebral. Isso faz com que sejam lidos milhões de dados, que geram uma hiper construção de pensamentos jamais vistos na história, resultando na SPA”.

Sobre o assunto recebi, por meio de redes sociais, dois posicionamentos extremo de amigos. O primeiro ao pegar o filho na residência da ex-esposa durante o final de semana criou uma regra: “Enquanto estão juntos nenhum dos dois utilizam o celular”. O segundo descartou um presente que o filho recém-nascido ganhou. O que era o presente? Um produto multimídia que promete transformar a criança em um “ser superdotado”, por meio de práticas interativas.

Amados leitores e amadas leitoras, não tenho capacidade para ser referência neste assunto, mas, julgo-me na obrigação de expor meu ponto de vista a cada um de vocês, com o intuito de provocar reflexões. Nosso contato semanal tem esta finalidade.

Cada um tem plena liberdade de criar da forma que melhor entender, mas, deixar as crianças expostas é um perigo. Assim eu penso.

Crônica de Ademar Rafael

ANICETO ELIAS DE BRITO

Na data de hoje, no ano de 1977, eu assumia o emprego no Banco do Brasil e deixava de pertencer ao quando de funcionários do “Bazar das Miudezas”, depois transformado em “Borbão”, por isto quero registrar minha gratidão ao ex patrão, meu grande e imortal mestre.

Na segunda metade da década de setenta pelas mãos de Dimas Mariano, funcionário da empresa de produtos agropecuários (CRC) que funcionava em frente à Panificadora de Severino Lolô e ao lado da Peixaria de Minéu, cheguei ao “Bazar das Miudezas” para a missão impossível de substituir Danizete.

Durante o período de longo aprendizado contei com apoio do proprietário o que inspirou o jovem poeta Elais – irmão de Danizete e Diomedes – a criar esta pérola: “Tem Evandro que é péssimo camarada/Diomedes que
ali nada resolve/Tem Elias que nunca desenvolve/Vilani que é tonta e azoada/Geraldina que não sabe de nada/E Luzia que não presta atenção/Diomedes é ruim que só o cão/E Evandro além de ruim é analfabeto/Prá fazer o gosto de Tio Aniceto/Só Ademar, Danizete e outro não.”

As viagens para Tavares – Paraíba, invariavelmente depois do “Qual é a música?” nas noites de domingo eram sempre uma aula para este cronista. Aniceto não perdia oportunidade de dar bons exemplos, contar histórias sobre figuras de relevo no mundo político.

Numa destas viagens, durante uma crise de diabetes, Aniceto perguntou se eu sabia dirigir. Como já havia conduzido carros de Quincas Rafael anos antes disse que sim. Ele prontamente passou para o bando do carona e mandou que levasse a Brasília. Naquele trajeto fiz todas as barbeiradas possíveis e imagináveis, dava para perder um duzentos pontos na carteira e pagar valor expressivo de multas. O trecho Entrada do Sítio Matalotagem/Princesa Isabel – com chuva, meu estado etílico e estrada ruim -, permitiu que o lema: “Dirigido por mim e guiado por Deus” fosse aplicado na integra. Chegamos vivos por obra e graça de DEUS. De Princesa para Tavares ele retomou direção, poupando novas vidas.

Na última viagem, antes de assumir o emprego no Banco do Brasil, Aniceto deu-me o seguinte conselho: “Seja você mesmo, respeite a todos e seja honesto em todos os seus atos”.

Nos anos 70 Aniceto pregava o que de mais contemporâneo existe na relação empresa x cliente, destaco aqui os seguintes pontos: “Chame o cliente pelo nome; crie uma relação de confiança; seja consultor do cliente, apresente alternativas; demonstre boa vontade ao expor os produtos; não permita que o cliente saia sem comprar algo; cumpra tudo que prometer; gere motivos para que o cliente volte e compre SEMPRE…”

Adaptado da crônica Pessoas do meu sertão XXV – www.afgoadosdaingazeira.com.br

Crônica de Ademar Rafael

O DEVER DE CASA

Se existe uma coisa sobre a qual eu não tenho dúvida é que a convivência harmônica entre a produção e a preservação do meio ambiente tem pouco da situação econômica ou financeira dos envolvidos e tem muito da
noção exata de cidadania e do pensamento coletivo.

Conheci em Barra do Choça – BA um pequeno agricultor, graduado em agronomia com muito esforço pela Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB, provedor de família digna com a renda de uma pequena
propriedade onde cultivava café na sombra, milho, feijão, mandioca, forragem para gado de leite, aplicava a técnica sustentável de corte seletivo de madeira nobre e criava pequenos animais e peixes.

Testemunhei na Amazônia a nociva pratica de colonos que ao receberem um lote em assentamento do INCRA a primeira coisa que faziam era retirar a madeira, inclusive de castanheiras, para vender por preço de banana. Outros vendiam hastes do açaí para retirada do palmito, também por preço aviltado. Cabe registrar que a maioria dos colonos criticavam o procedimento inadequado dos seus pares e preservaram seus lotes.

A revista época negócios de março-2020, na série de reportagem sob o título “Capitalismo em transe”, apresenta estudo do grupo canadense Corporate Knights com base em dados de sete mil organizações mundiais sobre sessenta e cinco indicadores ambientais, sociais e econômicos. As duas empresas classificadas como mais sustentáveis no mundo são da Dinamarca. A primeira é a Osted A/S, do setor de energia; a segunda é a Chr. Hansen Holding A/S, do setor de alimentos. A terceira colocada é a Neste Oyj, do setor de petróleo da Finlândia.

Cabe registrar que a Dinamarca começou investir em energia eólica nos anos 1970, nós estamos pensando em tributar o setor. Sim, o Banco do Brasil aparece na nona posição, a Cemig em décima nona e a Natura em
trigésima. A convivência harmônica é possível? Decida.

Crônica de Ademar Rafael

NÃO VOU SAIR

Por: Ademar Rafael

Na época do regime instalado no Brasil após movimento de 1964, que cada um denomina como melhor lhe convém, o slogan “Brasil, ame-o ou deixe-o” era repetido e estampado todo momento.

Hoje, no auge dos meus 63 anos, tenho uma percepção que muito foram amando o Brasil e outros tantos ficaram sem amar a pátria. O resultado é este país que temos, onde “patriotas” traem os interesses de nação e “traidores” defendem até a morte atitudes que agregam valores as causas nacionais.

A música e a poesias são dois dos poucos remédios, sem custo, que reduzem os impactos que as dualidades acima mencionadas causam em mentes de pessoas do bem.

Neste sentido transcrevo na íntegra a letra de uma música do final dos anos 1980, da lavra de Celso Viáfora, intitulada “Não vou sair”: “A geração da gente/Não teve muita chance/De se afirmar, de arrasar, de ser feliz/Sem nada pela frente pintou aquele lance/De se mudar, de se mandar desse país/E aí você partiu pro Canadá/E eu fiquei no ‘já vou já’/ Pois quando tava me arrumando/Pra ir/Bati com os olhos no luar/E a lua foi bater no mar/E eu fui que fui ficando… – Distante tantas milhas/São tristes os invernos/Não vou sair, tá mal aqui, mas vai mudar/Os velhos de Brasília/Não podem ser eternos/Pior que foi, pior que está, não vai ficar/Não vou sair/Melhor você voltar pra cá/Não vou deixar esse lugar/Pois quando tava me arrumando/Pra ir/Bati com os olhos no luar/E a lua foi bater no mar/E eu fui que fui ficando…”

Como é real a letra de “Não vou sair”. Omissos nos agarramos na beleza do luar, no mar, na esperança que as coisas vão melhorar, na renovação dos “velhos de Brasília”. Ficando e agindo individualmente, esquecendo o Brasil nada muda. Vamos decidir verdadeiramente: “Amar ou deixar”?

Crônica de Ademar Rafael

A MÚSICA DA MINHA INFÂNCIA

Por: Ademar Rafael

Um dos meus vícios é ouvir rádio, aprendi com meu saudoso pai na época que morávamos na Quixaba – Jabitacá – PE. Era sagrado ouvirmos cantorias na Borborema de Campina Grande – PB, Espinharas de Patos – PB e Pajeú de Afogados da Ingazeira – PE. Na calçada da casa onde nasci os moradores ficavam em silêncio para ouvir a “Voz do Brasil” e outros programas que meu pai sintonizava no velho ABC, “A voz de Ouro”.

Na época que deixei meu sertão para andar pelo Brasil, na condição de funcionário do Banco do Brasil perdi o contato com tais emissoras, no entanto, o Programa “Adelzon Alves o amigo da madrugada”, na Rádio Globo – Rio de Janeiro –RJ foi meu companheiro muitas noites.

Quando voltei para o nordeste em 2015, já com o advento da internet, voltei a ouvir regularmente a Rádio Pajeú. Recentemente da inquietude poética de Alexandre Morais fez nascer o “Palco Pajeú”, programa que tive a honra de participar no último sábado de 2019.

É o que de melhor apareceu nos últimos anos. A quarentena da COVID-19 não interrompeu sua apresentação, Alexandre Morais e Ney Gomes se viram nos 120 – a atração tem duas horas de duração – para levar aos ouvintes o “Palco Pajeú”.

O programa de 24.04.20 trouxe como tema “A música de minha infância”. Ao sintonizar a Rádio Pajeú 99,3 naquela tarde de sábado rodou um filme em minha memória para resgatar a música da minha infância. Foi fácil localizar não apenas uma, mas, três: “Coração de Luto”, de Teixeirinha; “Serrote Agudo”, de Luiz Gonzaga e Zé Marcolino e “Índia”, de Manuel Ortiz Guerrero e José Asunción Flores, versão de José Fortuna e imortalizada nas vozes de Cascatinha & Inhana.

Hoje, cinquenta anos depois, tenho certeza que em um filme sobre minha vida as três músicas acima estariam na trilha sonora.

Crônica de Ademar Rafael

OUVINDO SEMPRE

Por: Ademar Rafael

Ouvir os consumidores dos seus produtos e os usuários dos seus serviços é uma prática que muitos deixam de lado e com isto perdem espaço e somem do mercado.

Tenho o hábito de consultar meus leitores e minhas leitoras através do “facebook”. Por tal aplicativo recebo avaliações positivas e negativas. Outro método que utilizo é ouvir pessoalmente meu público. Em uma dessas conversas ouvi do amigo Marcos Cocada um pedido da fazer crônicas sobre pessoas de nossa região. Passei a dedicar a última crônica de cada mês para este grupo e a receptividade tem sido boa.

Na segunda quinzena de maio recebi um recado do leitor assíduo e grande amigo Pedro Alves, humanista, médico e vive-prefeito de Iguaraci.O que disse o filho de Sebastião da Farmácia? “Ademar direcione suas crônicas para nossa região, você algumas vezes escreve sobre temas distantes da nossa realidade”. Os pedidos do Dr. Pedro e de Marcos são ponderações corretas e merecem toda atenção. Desta forma ao escrever doravante vou lembrar que o propósito deste espaço é criar um ambiente com estreita compatibilidade com nossas origens.

A grande maioria dos assuntos sobre os quais escrevo são inspirados em leituras que faço ou em observações nas áreas em que estou atuando. Não gosto de escrever sobre personalidades. Prefiro uma abordagem sobre processos e comportamentos, que promovam reflexões. Contudo, levarei em consideração as observações do amigo Pedro Alves.

Ao particularizar corremos o risco de cometer atos falhos. Certa vez escrevi uma crônica sobre Manoel Jerônimo. Recebi um telefonema de um dos seus filhos que agradeceu a homenagem, mas, disse-me: “Ademar, papai está vivo”.  Eu havia escrito que nosso sindicalista havia falecido. Com redobrada atenção continuarei ouvindo sempre, provocando reflexões e diversificando dentro de limites aceitáveis.

Crônica de Ademar Rafael

JOSÉ GOMES DO AMARAL

Novamente recorremos ao livro do poeta egipsiense Antônio José de Lima “Legado filosófico de poetas e repentistas semi-analfabetos”, que assim qualifica Zezé Lulu; “… analfabeto confesso, porém, tinha a clareza da força divina que habitava o seu ser, quer fosse às ações, na humildade e, principalmente, nos repentes nas cantorias de pé de parede ou nas rodas de glosas.” Do mesmo exemplar extraímos esta pérola de sextilha: “Essa palavra ciência/Deus a mim não concedeu/A minha mão não escreve/Minha boca nunca leu/Mas, vivo estudando os livros/Que natureza me deu.”

Para este cronista Zezé Lulu era a exata figura do cantador de raiz, aquele que se reveste somente da inspiração para fazer seus versos. Tudo seu era natural, o sentido artificial das cosias não alcançou o poeta que nasceu no mesmo Sítio Serrinha onde recentemente faleceu Valdir Teles. Zezé Lulu, mesmo carregando a humildade que fala Antônio José de Lima, transitou pelo meio de todas as feras do repente sem envergonhar a classe. Cantando com quem quer que fosse ele era ele mesmo. Não maquiava nada para agradar, suas criações tinham uma marca própria.

Ainda Terezinha Costa, no livro “São José do Egito – Musa da poesia”, narra estas duas magistrais sextilhas de Zezé Lulu: “Eu admiro a aranha/Pela casa que constrói/Cavar no chá um buraco/Pra que aquele lhe apóie/ Botar-lhe mais uma tampa/Que nem a chuva destrói” e “Em cima de um pé de uva/O canário e o vem-vem/E a rolinha saudosa/Pousa prá cantar também/E o concriz canta olhando/As cores que a pena tem”.

Luís Wilson, em “Roteiro de velhos cantadores e poetas populares do sertão” nos traz esta sextilha de Zezé Lulu, falando sobre sua filha: “Já está chegando a hora/Da minha linda ‘galega’/Sair lá pelo terreiros/Dando ração a borrega/E perguntando: ‘Mamãe/Quando é que papai chega’?”

Adaptado da crônica “Pessoas do meu sertão XXIV” publicada em www.afogadosdaingazeira.com.br