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Ontem, Hoje e Amanhã

Por: Milton Oliveira

Ontem, nem sequer tinha noção da cor dos teus olhos; sabia que tu virias para ficar, mas os horizontes, à minha frente, eram promessas, apenas; decidi descobrir o que estava adiante.

Ontem, só pensava em ser feliz: brincava, sorria, tomava banho em rios, corria pelos caminhos que me levariam a algum tesouro, não sabia qual era, nem onde estava. Nunca o encontrei em definitivo, mas fui venturoso.

O ontem virou hoje: encontrei a outra metade da minha laranja e tu ameaçavas chegar a qualquer momento.

Continuei a ser ditoso, agora de outra forma, já que passei a depender de alguns comportamentos daqueles que estavam ao meu lado. Era outra fase, não tinha dúvida. Minha alma frívola jamais se intimidou com isso.

Chegaste! E tomei conhecimento não só da cor dos teus olhos, mas também do teu temperamento, da tristeza das tuas lágrimas, da beleza do teu riso, da felicidade de seres minha e eu, teu, sempre.

Depois de ti, outros vieram. Juntos, usufruímos do sossego e da embriaguez de sermos um só organismo humano. Nossas cores e miasmas se fundiam; éramos o que esperávamos ser.

Algumas curvas adiante; o amanhã nos aguardava, como um caçador à espera da presa.

Teus filhos, hoje, são exatamente o que foste para mim: esperança, amor e apreensão.

O trem do tempo não para; estaciona aqui e ali, mas avança sempre. No percurso, experimentamos os êxtases dos lados direito e esquerdo do caminho. Tiramos nossas próprias conclusões, aparentemente diferentes umas das outras; na verdade, exatamente iguais. Tudo a depender do enlevo guardado no coração.

Relutamos em concluir que somos iguais, apesar de o relógio do tempo acusar nossas diferenças, normalmente na maneira como gastamos o excesso de minutos.

Então, chegou novo amanhã. Com ele a impossibilidade de ressuscitar o ontem, exceto na memória e na emoção.

Desci a ladeira que tu e os demais têm à frente – caminhem com cuidado, pode ser que pisem em falso e o imposto cobrado é elevado; muitas vezes, será pago em suaves prestações durante a vida inteira.

Estou no final da subida. A cada volta dos ponteiros do tempo, uma nova dor me incomoda. Sem falar na solidão que me angustia, como se eu fosse um sentenciado. Quando menos esperarem, definitivamente se acabarão os meus ontem, hoje e amanhã.

Só restará o espaço vazio como um recipiente cheio de ar. Então, serei esquecido e nunca mais ninguém pronunciará meu nome.


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2 Comentários
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Marilsa e Nazário
4 meses atrás

Boa noite Milton, eu e teu tio achamos que vc jamais será esquecido, hoje , amanhã e sempre. Que Jesus te dê forças para que vc consiga enfrentar esta solitária caminhada.

Fábio José Castelo Branco Costa
4 meses atrás

Como sempre você nos ensina muito sobre os encantos e os dissabores da vida. Texto ótimo. Mas lembre-se que ninguém será esquecido quando se torna responsável por cativar tantas pessoas.