As panelas da casa grande.
E agora, Dona Maria? Acabou a comida? O gaz tá caro? A farinha tá pouca e o pirão lá nas alturas. Ei! Tá caro alho, né?
Presenciei esse diálogo entre um transeunte e uma senhora, certo dia em uma das ruas do bairro da Madalena, aqui em Recife.
_ O que será que será?
_ Quem vem lá?
_ Mas será o Benedito?
Até um dia desses, batiam frigideiras de inox, pensando ser tamborins nos sambódromos do Rio de Janeiro ou de São Paulo. Até um dia desses, batiam panelas, piscavam luzes, e do alto de suas janelas, cuspiam ódio sobre o chão da Pátria.
Eu prefiro bater pandeiro, é melhor que bater tijolo, né não véi? Também acho! Assim como acho que deveríamos sentir na pele, a pancada do ritmo da dor dos que batem a cara nos muros das fábricas, procurando emprego, se pendurando nos andaimes cinzentos das construções, ou se enfurnando na quentura das carvoarias, tentando dar a seus filhos sabedoria e discernimento para distinguirem quem é e quem não é capaz de honrar as cores da bandeira dessa terra chamada Brasil.
_ E agora, Dona Severina?
_ E agora, Seu Severino, Seu Fulano, Seu Beltrano, Seu Sicrano?
_ Quem vem lá?
_ “Não sei, não sabes, ninguém”. “Nada além, nada além de uma ilusão…”
A democracia está a milhões de anos-luz além dos determinismos da direita ou da esquerda. Os discursos retóricos da elite que se diz socialista já não me engabelam mais. Eles não dividem nada além do seu redor.
A consciência do direito de escolha nasce de uma coisa muito simples: educação. Mas os da casa-grande batem as portas, molham o giz e ensebam os quadros negros, com medo que a senzala aprenda a ler.
_ Ô de casa!
_ Quem vem lá?
_ É a fome!
_ Perdoe, passe outra hora. Acabei de alimentar meu cachorro. Não sobrou nada!
E assim se segue, mesmo que se negue, mesmo que escorregue na lama que sucumbiu Mariana e poluiu o Rio Doce. Mesmo que se enterre nos escombros da boate Kiss, a indignação de centenas de pais de família, ainda creio na justiça humana. A divina é imprescindível, mas mesmo que se lave a jato, não haverá água benta que chegue para benzer caixões, nem lavar a sujeira que há embaixo dos tapetões dessa casa-grande.
Por:Maciel Melo