A Mentira e o Crime
À sombra de uma amarga decepção, procuro extirpar do peito esse desgosto atroz. E faço movido pelo ânimo do doloroso dever de quem expeli um natimorto, haja vista a incoerência da razão alheia e a insipidez do sentido público dos atos guerreados adiante.
Esclareço, de pronto, que ajo com profunda sinceridade e, dessa forma, não necessito pedir permissão a ninguém para encorpar meu desabafo. Acima de tudo, tenho consciência do meu ato e não nutro medo algum no que estou fazendo.
Como cidadão que sou, cumpridor dos meus deveres e fiel pagador de impostos, posso dar-me ao direito salutar de requerer o mínimo respeito ao meu ponto de vista e, em razão disso, ter vigor bastante para repudiar, com veemência e enfado, o descalabro e o embuste, notadamente quando eles se evidenciam jungidos ao crime.
Que torpe fatalidade é essa que me avilta o espírito ordeiro e discreto?
A amada avenida Rio Branco, berço público que me viu crescer, guardou todos os meus devaneios de criança e adolescente e estimula meu imoderado idílio de nela encarcerar meu crepúsculo fatídico, tem suportado as mudanças inerentes à marcha inexorável dos anos.
Na década de 1980, o prefeito de então fez algumas reformas nessa famigerada avenida, arborizando-a devidamente, transformando-a em dois braços abertos ao redor de um corredor de fronde víride a acolher os visitantes e os moradores do lugar.
Trinta anos depois, lá vem nova mudança.
A preocupação dos moradores dessa querida avenida se focou nas árvores frondosas, de sombras aprazíveis.
Para alívio geral, assegurou o prefeito e seus asseclas envolvidos no novo empreendimento de reformulação da avenida que nem uma árvore – vejam bem! – nem uma delas seria sacrificada; pelo contrário, outras mais viriam juntar-se ao arvoredo atual, para a maior beleza e encantamento dessa via pública tão amada.
E o que vemos, agora, com o início da execução do projeto?
Trator voraz arranca árvores enormes, serra enlouquecida corta trocos e raízes, numa destruição desnecessária e irresponsável. Onde havia verdor impera destroços, terra revirada, folhas secas.
Trinta anos de fecundidade e floração, de vicejo e guarida jogados no lixo! Não sou contrário ao novel projeto, menos ainda alimento qualquer animosidade em relação ao atual prefeito e aqueles responsáveis pelo empreendimento reformatório.
Faço objeção à mentira, principalmente aquela alardeada em praça pública e com fito único de enganar.
Sou radicalmente contrário ao crime ambiental e a destruição desnecessária que a administração pública da minha cidade está cometendo, sem o mínimo de respeito à natureza e aos munícipes, em especial àqueles, como eu, residem e sempre viveram na Avenida Rio Branco.
Volto a enfocar que não me estimula medo algum no que afirmo; a sinceridade já se contenta com a coragem indispensável ao seu nascedouro.
Milton Oliveira (Escritor/Advogado) 10/outubro/2017.