Morador do município de Cedro, no Sertão Central de Pernambuco, o jovem Weverton de Cássio da Cruz, 20 anos, possui transtorno bipolar. Vítima de preconceito, deixou a escola e ficou em casa, sem fazer nada, segundo relatou. Isso foi há dois anos. De lá para cá, toda quinta-feira ele se desloca seis quilômetros até o Sítio Barro Branco, onde planta e colhe diversas variedades de hortaliças, como alface, cebolinha, rúcula, coentro, entre outros.
A nova ocupação de Weverton, a agricultura, faz parte do projeto Horta Feliz, idealizado por Manoel Costa, engenheiro agrônomo e extensionista do Instituto Agronômico de Pernambuco (IPA). O projeto – desenvolver hortas para pessoas com deficiência – é pioneiro no Brasil e tem muito a comemorar neste 03 de dezembro, Dia Internacional da Pessoa com Deficiência.
“Pra mim, é muito importante ter essa camisa do Horta Feliz, ter pessoas que se importam comigo. Diz um parágrafo da bíblia que cada pastor tem suas ovelhas. Então, Manoel é o nosso pastor, somos guiados por ele. O trabalho mudou muita coisa na minha vida. Em casa, a gente ficava sem fazer nada, sem planos. O Horta Feliz ajudou na coordenação motora, porque a gente faz muitos exercícios. Em meu nome, e em nome dos meninos, a gente agradece toda a equipe”, declarou Weverton, referindo-se ao outros 21 jovens que participam do projeto e a equipe técnica.
Entre esses jovens, que são alunos da Escola Estadual Valdicliwtson da Silva Menezes, existem pessoas com Síndrome de Down, deficiência visual, dificuldade motora e outros exemplos. Todos, sem exceção, já trabalham na terra. Aprenderam a diferença das culturas, a distância do plantio, o tamanho do canteiro, o manejo da colheita, enfim, o passo-a-passo para trabalhar em uma horta, neste caso, orgânica. “Eles não conheciam nem as plantas e nem as cores. No processo de alfabetização, nós trabalhamos a diferença das cores”, explica Manoel. Ele acrescentou que existem jovens que já foram capacitados, casaram e vivem da agricultura, além de outros que reduziram os medicamentos.
O engenheiro agrônomo afirma que o Horta Feliz é um projeto de inclusão social e terapia de valorização desses jovens com deficiência, que são filhos de agricultores. Para o trabalho vingar, Manoel conta com alguns parceiros, como os donos da propriedade, que cederam o espaço para a horta; os professores, que acompanham as aulas; o motorista, que conduz os alunos; e os fisioterapeutas, que orientam alguns exercícios.
“A assistência técnica e extensão rural do IPA atende os agricultores em suas especificidades. O que nós estamos provando é que existem metodologias e estratégias que valorizam as diferenças e fazem com que as pessoas sejam produtivas. Nós estamos trabalhando com quebra de paradigmas. É preciso ter sensibilidade para perceber as diferenças e direcionar as atividades, de acordo com as habilidades de cada um. O IPA fortalece a agricultura familiar e suas especificidades. A dinâmica de aprendizagem é diferente, mas todos absorvem a informação e se torna produtivo”, declarou Manoel.
Os produtos do Horta Feliz são comercializados em feiras livres, em escolas da rede pública inseridas no Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), do IPA, e em um centro social do município. Parte das hortaliças produzidas ainda é doada à escola onde os jovens estudam. Além disso, eles utilizam o lucro das vendas para a compra de insumos e equipamentos. “A gente está dando uma oportunidade para que os meninos tenham alguma atividade”, observou um dos proprietários do Sítio Barro Branco, José Joaquim do Nascimento.
A professora Eliene Romão acompanha os alunos dentro e fora da sala de aula. Ela ressalta a inclusão deles na vida social do município. “Muitas vezes eles são isolados. Aqui é um local rural, a fonte de renda é a agricultura. Eles estão contribuindo para o desenvolvimento econômico do lugar, se sentindo úteis e também estão desenvolvendo suas habilidades. Uma pessoa testemunhou ‘aqui no Cedro tem esse tanto de gente de pessoas com deficiência?’. A pessoa ficou surpresa, porque muitos ela nem conhecia. E, aqui, é uma cidade muito pequena, praticamente todo mundo se conhece. Esse projeto foi tirando as pessoas de casa para participar de um show, de uma missa, de outras atividades. Eles passaram a quebrar as algemas da questão da convivência social. Eles participam mais da escola, se abrem, dizem o que sentem”, comemora a professora.
O projeto também é aprovado pelos pais dos alunos, como é o caso de José Manoel de Souza. A filha de 26 anos, Joedna Teresinha de Freitas Souza possui deficiência mental, e a Horta Feliz ajudou no relacionamento com a família. “Ela era muito irritada, mas com a roça ela está mais contente. A gente também tem mais entendimento para conversar com ela. Eu fico muito contente”, disse o pai.
Joaquim José do Nascimento se mostra otimista quanto ao futuro do neto Leonardo José do Nascimento de Souza, 16 anos, que possui Síndrome de Down. “Para Léo esse projeto é muito importante, porque depois da escola e vem para a horta aprender outras coisas, aprender a seguir a vida. Ele se sente muito feliz em estar aqui”, pontuou o avô.
Os parceiros do projeto Horta Feliz são: Escola Estadual Valdicliwtson da Silva Menezes, onde os jovens estudam; escolas municipais Castro Alves e Manoel Marculino; Faculdade Leão Sampaio; grupo Irmãos Guanellianos, pertencente à Igreja local; Centro de Convivência Social – PET Cedro; Prefeitura de Cedro; professores e representantes da sociedade civil.