Em solenidade, ontem, na Câmara de Vereadores, o jornalista afogadense Magno Martins, recebeu o título de cidadão de Jaboatão, iniciativa do ex-vereador Jota Barreto (PSD), tendo sido aprovado há três anos. Tudo transcorreu com um toque de muita emoção. Abaixo, confira a íntegra do seu discurso:
‘Venho do Sertão, sou filho de vidas secas, donatário das capitanias de Graciliano Ramos, herdeiro fiel de Euclides da Cunha.
Venho do Pajeú das flores, onde em todo o canto que se olha não se enxerga o verde da esperança, apenas o cinza da realidade nua e crua.
O sertão é sem lugar, não tem janelas, nem portas.
O sertão é do tamanho do mundo. Está dentro de mim, impregnado como um perfume sedutor. É como uma mulher bonita, que encanta e seduz.
É inspiração, norte de vida, bússola, canto de viola.
No meu sertão, todos os cantos são pobres e belos. O canto de se ouvir, venha de onde vier, do sabiá, do acauã, do repentista, é belo.
Vir ao mundo por aquelas bandas não chega a ser uma sentença de condenação à pobreza, passada em julgado, mas é quase um fadário. Quem por ali nasce, gruda na terra e na poesia e nunca deixa seu canto.
Uns porque escapam da morte Severina, que é morrida como anjinho, mas que não escapam, antes dos vinte, da morte matada na emboscada.
Outros porque são tão teimosos que mastigam e engolem a sede braba. Não dão o braço a torcer, nem deixam a estiagem vencer a coragem.
João Guimarães Rosa disse que quem entende de Sertão é urubu, é gavião, é gaivota.
Todos esses pássaros, porque eles estão sempre no alto, apalpando ares com pendurado pé, com o olhar remedindo a alegria e as misérias todas.
A vida é ingrata no macio de si, mas traz a esperança, mesmo vinda do fel do desespero.
No Sertão, como disse Guimarães Rosa, o correr da vida embrulha tudo. Lá, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e afrouxa, sossega e depois desinquieta.
O que ela quer da gente é coragem.
Minhas senhoras, meus senhores:
Jaboatão adota, hoje, nesta noite memorável, um sertanejo de alma pura, um sonhador, um repórter nato, que nasceu para a notícia.
Jaboatão me acolhe reconhecendo essa bravura e essa coragem sertaneja.
E esse reconhecimento, feito hoje pela Câmara de Vereadores, por iniciativa do vereador Joaquim Barreto Filho, o Jota Barreto, filho do meu amigo Joaquim Barreto, ex-presidente deste parlamento, é fruto de um longo trabalho jornalístico em defesa dos mais altos interesses de Jaboatão, de Pernambuco e do Brasil.
Título de cidadão é uma adoção oficial. Hoje, sou cidadão adotivo de Jaboatão. Jaboatão me abraça como irmão, conterrâneo, uma pessoa da sua gente e do seu meio.
Eu abraço Jaboatão e encampo com bravura, mais do que fiz no passado, com o poder da minha pena e a bravura da minha voz, todas as lutas do seu povo em favor de uma cidade mais justa e humana.
Hoje já posso dizer: “Sou cidadão onde a Pátria nasceu”. Porque foi aqui que brotou o nosso grito libertário, onde ocorreram duas batalhas entre os luso-brasileiros e holandeses em Pernambuco, em 1648 e 1649.
E que culminaram na expulsão da Invasão dos Holandeses no Brasil. Foi dessas batalhas que surgiram o primeiro sentimento de ‘PÁTRIA BRASIL’, de amor à Nação, tendo simbolicamente nascido também o Exército Brasileiro.
Que possamos louvar neste momento os grandes heróis das Batalhas dos Guararapes, como o general Francisco Barreto de Menezes, André Vidal de Negreiros, João Fernandes Vieira, Filipe Camarão, Henrique Dias, Antônio Dias e Antônio Silva.
Quanta honra para um pobre plebeu! Já posso estufar o peito e dizer “Sou filho da “moscouzinho”“.
Foi assim que minha nova pátria ficou conhecida no mundo inteiro por ter sido o primeiro município brasileiro a eleger um prefeito comunista, em 1947.
Se a pátria nasceu aqui, aqui também dei os meus primeiros passos no Jornalismo como estagiário na Assessoria de Imprensa da Prefeitura de Jaboatão.
Foi na gestão do saudoso Geraldo Melo, a quem presto também uma homenagem na pessoa do seu filho Geraldo Filho, aqui presente.
Criei, assim, um elo com Jaboatão desde os anos 80, uma relação de intimidade, confissões e amor.
Foi aqui, também, que escolhi para viver quando regressei de Brasília em 2002 e casei com a mais combativa vereadora do Recife, Aline Mariano, depois de 20 anos em Brasília, meu exílio voluntário.
Jaboatão, portanto, é parte da minha vida, essência do meu viver. Eu a considero importante por ter brotado aqui a minha formação e consciência de jornalista.
E com isso ter feito da minha profissão o essencial, o fundamental, a base da minha vida.
Por ter sido realmente um puro jornalista. Por ter procurado no jornalismo a satisfação de um talento natural que eu tinha, e não sei de onde vinha.
Um jornalista, além de talento precisa de muito trabalho, em primeiro lugar. O talento só não basta. Ele precisa de muita vivência, ele tem que mergulhar realmente na vida, para poder transmiti-la.
Porque o jornalista não é um criador de fatos, ele é um transmissor e precisa saber ver. E saber ver é só vivendo.
Além do seu talento natural, é preciso ter a paixão pela profissão. É fundamental em jornalismo. Tem que ser uma paixão verdadeira.
Já dizia Rui Barbosa que a Imprensa é à vista da Nação. Para se fazer jornalismo de verdade e com responsabilidade é preciso ter a consciência de que é um ofício em defesa da sociedade.
Jornalismo é publicar aquilo que alguém não quer que se publique. O resto é publicidade.
Para mim, Jornalismo é uma paixão insaciável que só se pode digerir e humanizar mediante a confrontação descarnada com a realidade. Quem não sofreu essa servidão que se alimenta dos imprevistos da vida, não pode imaginá-la.
Quem não viveu a palpitação sobrenatural da notícia, o orgasmo do furo, a demolição moral do fracasso, não pode sequer conceber o que são. Já disse Gabriel Garcia Marquez:
“Ninguém que não tenha nascido para isso e esteja disposto a viver só para isso poderia persistir numa profissão tão incompreensível e voraz, cuja obra termina depois de cada notícia, como se fora para sempre, mas que não concede um instante de paz enquanto não torna a começar com mais ardor do que nunca no minuto seguinte”.
Jornalismo, portanto, é como se fosse um fio, que liga as pessoas ao mundo.
Quero agradecer a honraria de virar cidadão de Jaboatão primeiro a Jota Barreto, autor da proposição, ao seu pai Joaquim Barreto, filho do saudoso Zequinha Barreto, que foi subprefeito deste município e a todos os vereadores que compõem esta Casa.
Agradeço de modo especial ao presidente desta Casa, Ricardo Valois, empresário de visão, que honra o seu mandato parlamentar, pelo apoio e o interesse em realizar esta sessão, que tanto me emocionou.
A Milton Tenório, meu amigo, esse jaboatonense guerreiro, que tanto nos ajudou nesta cerimônia.
Minhas senhoras, meus senhores.
Não poderia encerrar esta fala sem voltar às minhas origens. E voltar ao Sertão é ter diante de mim, como luz permanente de inspiração, a figura dos meus pais.
Perdi, há pouco, minha mãe, a luz do meu saber, de personalidade tão forte que às vezes não sabia se estava diante dela ou do meu avô, de tão durona, inflexível nos ensinamentos, dócil no trato, extremamente afetiva, amante da vida e dos seus prazeres.
Mas, Deus me deu a benção de manter firme e forte a figura do meu pai, o varão da família. Que em um dos seus livros definiu impecavelmente a maneira de ser, retratando simplicidade, sabedoria e desapego as coisas materiais da vida.
O bom da vida, segundo a filosofia do meu pai, é ser e não parecer, regar sonhos, viver para servir.
Já Rubem Alves diz que nós não vemos o que vemos, nós vemos o que somos.
Só veem as belezas do mundo e deixam lições para nós, como o meu pai, aqueles que têm beleza dentro de si.
Uma pessoa é bela, não pela beleza dela, mas pela beleza nossa que se reflete nela.
Quem ama a simplicidade, como meu pai nos ensinou, ama a vida, ama a beleza, ama a poesia, ama as coisas que dão alegria, ama a natureza, ama a reverência pela vida, ama os mistérios de Deus, ama a Deus.
Muito obrigado, Jaboatão! ‘