Por G1 — Brasília
O presidente Jair Bolsonaro confirmou neste sábado (6) que o governo passou a adotar uma nova sistemática para prestar informações sobre o avanço da pandemia do novo coronavírus no país, com a divulgação dos números de casos e de mortes pela doença apenas a partir das 22h.
Inicialmente, o boletim era divulgado às 17h. Depois, passou a ser apresentado às 19h. Nos últimos dias, a divulgação começou a ser feita às 22h, sem que o Ministério da Saúde desse uma justificativa para o atraso.
Além disso, o portal do governo federal que traz os números da pandemia no Brasil está fora do ar. Ao ser acessada, a página apresenta apenas a mensagem “Portal em Manutenção.” Por volta das 12h deste sábado, o site continuava fora do ar.
No noite de sexta (5), o presidente se pronunciou pela primeira vez sobre a mudança no horário de divulgação dos balanços. Questionado por jornalistas em frente ao Palácio da Alvorada, Bolsonaro disse: “Acabou matéria no Jornal Nacional.”
Depois, o presidente alegou que o atraso se devia à necessidade de pegar com os estados dados mais consolidados, mas não explicou por que, por mais de 70 dias, foi possível consolidar os dados mais cedo. Ele também não informou por que os números que são divulgados às 22h constam de uma planilha que atualiza dados até as 19h.
Neste sábado, Bolsonaro voltou a falar sobre o assunto, desta vez por meio de uma rede social. De acordo com o presidente, o “Ministério da Saúde adequou a divulgação dos dados sobre casos e mortes relacionados ao Covid-19” e optou por divulgar o balanço diário mais tarde para “evitar subnotificações e inconsistências.”
“As rotinas e fluxos estão sendo adequados para garantir a melhor extração dos dados diários, o que implica em aguardar os relatórios estaduais e checagem de dados. Para evitar subnotificação e inconsistências, o Ministério da Saúde optou pela divulgação às 22h, o que permite passar por esse processo completo. A divulgação entre 17h e 19h, ainda havia risco subnotificação. Os fluxos estão sendo padronizados e adequados para a melhor precisão”, informou o presidente.
Na sexta, Jair Bolsonaro, como faz habitualmente, criticou o jornalismo da Globo e acrescentou: “Ninguém tem que correr para atender a Globo”.
Sobre a declaração, a Globo divulgou a seguinte nota:
“O público saberá julgar se o governo agia certo antes ou se age certo agora. Saberá se age por motivação técnica, como alega, ou se age movido por propósitos que não pode confessar mais claramente. Os espectadores da Globo podem ter certeza de uma coisa: serão informados sobre os números tão logo sejam anunciados porque o jornalismo da Globo corre sempre para atender o seu público”.
Decisão de divulgar dados mais tarde gerou críticas
A decisão de divulgar mais tarde o balanço diário sobre a covid-19 gerou críticas ao governo.
Numa rede social, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, disse que os dados do Ministério da Saúde “devem estar abertos ao público, aos gestores e, portanto, à imprensa de forma consistente e ordenada.”
A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) disse que “enquanto o número de mortos e contaminados atinge níveis recordes no país, ceifando a vida de milhares de brasileiros, o governo de Jair Bolsonaro opta por dificultar o acesso a informações sobre o avanço da doença.”
A ABI disse ainda que o Ministério da Saúde passou a atrasar a divulgação dos dados “na tentativa de calar a imprensa por meio do adiantado da hora.”
A vice-presidente da comissão mista do Congresso que acompanha o coronavírus, senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), informou que quer convocar o ministro interino da Saúde, Eduardo Pazuello, para dar explicações.
“A transparência é essencial para se combater a doença principalmente agora, com os números de infecção e óbitos crescentes. Não se pode imaginar ou permitir qualquer manipulação nessa área. Seria crime de responsabilidade”, disse.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, disse, na sexta, que, se o governo continuar atrasando a divulgação do balanço, o Congresso vai criar um sistema próprio com as secretarias estaduais de Saúde para atualizar os números.
“Nós temos que organizar de algum jeito as informações, é pra sociedade. O ideal é que o governo restabeleça isso o mais rápido possível. Espero que nos próximos dias o ministro da Saúde compreenda que informar é fundamental pra sociedade brasileira, principalmente num mundo tecnológico. Num mundo com tanta tecnologia, a gente omitir informação parece que é um erro muito grande.”
O ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Bruno Dantas também propôs a criação de uma rede paralela à do governo, envolvendo os tribunais de contas nos estados, para consolidação dos dados sobre a covid-19 e “divulgação diária até as 18h”.
Dantas, por meio de uma rede social, justificou a medida diante das “novas dificuldades para divulgar dados nacionais de infectados, curados e óbitos da Covid-19.”
OMS
Na mesma entrevista, concedida na sexta, em frente ao Palácio da Alvorada, Bolsonaro fez críticas à Organização Mundial da Saúde (OMS).
“O Trump [presidente dos Estados Unidos] cortou a grana deles, voltaram atrás em tudo. E adianto aqui: os Estados Unidos saíram da OMS. A gente estuda no futuro – ou a OMS trabalha sem o viés ideológico – ou nós vamos estar fora também. Não precisamos de gente de fora dar palpite na saúde aqui dentro”, disse o presidente.
Na sequência, Bolsonaro foi questionado se pretende fazer com que o Brasil deixe a OMS. Ele afirmou:
“É o seguinte: ou a OMS realmente deixa de ser uma organização política, partidária, assim, vamos dizer, até partidária, ou nós estudamos sair de lá”, frisou.