Por Mônica Silveira, TV Globo
Ao mesmo tempo que precisam reunir forças para atuar no combate ao novo coronavírus, os profissionais de saúde também encaram desafios, dramas e medos, por lidarem de maneira tão próxima com o perigo. Em Pernambuco, quarto estado com maior número de casos confirmados da Covid-19, médicos e enfermeiros contam que a tensão tem dominado a rotina nos hospitais (veja vídeo acima).
Até esta sexta-feira (17), Pernambuco contabilizou 2.006 casos confirmados da doença e 186 mortes. Nas Unidades de Terapia Intensiva (UTIs), uma das figuras fundamentais é a do médico intensivista, que monitora as funções orgânicas e percebe alterações em fases iniciais de determinadas doenças. Carlos Eduardo é um deles.
“Somos preparados para vários cenários, inclusive diferentes. Inclusive com treinamento para catástrofe, mas nenhum treinamento e nenhum curso preparou a gente para o que está acontecendo agora. Nunca tivemos medo de sair para trabalhar. Às vezes até temos por causa da violência, pelo risco ocupacional. Mas medo de voltar para casa a gente nunca teve. Eu tenho medo de voltar para casa”, disse o médico.
Formado há 13 anos, Carlos Eduardo é médico intensivista há 11 e contou sobre o medo de infectar pessoas próximas. “Estou no meu quarto isolado dos meus filhos, da minha esposa. O medo maior é passar para algum familiar de alto risco. E eu tenho meus medos porque sou obeso, hipertenso e tenho medo de precisar de cuidados mais avançados, de ir para a ventilação mecânica. Eu confio em todos os colegas que estão na linha de frente, mas o medo tem imperado no nosso meio”, afirmou.
Daniela Menezes, que é enfermeira, faz parte de uma das equipes que lidam com os pacientes infectados com a Covid-19. “Estar longe fisicamente dos meus familiares e amigos torna tudo mais difícil porque é o amor deles que me motiva e me dá força. Quantos aos pacientes, entre um e outro eu choro, entre um hospital e outro eu rezo. Entre uma melhora clínica e outra, eu vibro, me emociono e assim eu tenho vivido”, contou.
Nem mesmo quem trabalha em UTIs há mais de 20 anos deixa de se surpreender com o cenário atual da pandemia. O fisioterapeuta Francismar Ferrari lida diretamente com pacientes que estão com os pulmões altamente debilitados.
“Em 25 anos trabalhando em UTI, eu nunca vi acontecer o que está acontecendo agora. Eu nunca tive a oportunidade de ver tantos pacientes graves, precisando de ventilação mecânica, de cuidados intensivos e agudos de suporte de vida como estamos vendo agora. A doença é grave, tem sido desgastante para nós na UTI”, declarou.
Mesmo quem se paramenta com vários equipamentos de proteção individual não está totalmente imune ao novo coronavírus. A médica Ana Caribé contraiu a Covid-19, recuperou-se e voltou ao trabalho para combater a doença.
“No dia 23 de março, comecei a ter quadro de dor no corpo, dor de cabeça, febre. E poucos dias depois, eu tive a confirmação laboratorial que eu estava com coronavírus. Eu não tive indicação de internamento, eu fiquei em isolamento domiciliar, no meu quarto, evitando contato até mesmo com meu marido e com meus dois filhos. Fiquei bem, não tive sintomas respiratórios importantes, somente uma tosse seca e já estou de volta aos hospitais. Atualmente eu estou trabalhando em um setor de isolamento respiratório em um hospital público onde ficam os pacientes internados com coronavírus”, disse.
Segundo o médico intensivista Marçal Paiva Júnior, que trabalha há 13 anos em UTIs, a incerteza sobre um método eficaz de combate ao novo coronavírus é outro obstáculo psicológico para os profissionais de saúde.
“Neste momento, estamos passando por uma situação ainda mais complexa e complicada, com mistura de sensações, sentimentos que vão desde a vontade de salvar uma vida, aquela sensação boa quando você tira um paciente grave. Por outro lado, tem a impotência diante de situações irreversíveis, o medo de se contaminar, a angústia pelos colegas de trabalho que estão adoecendo. Vem a incerteza por parte da ciência. Ainda não temos muitas confirmações sobre o novo coronavírus, sem um tratamento completamente eficaz. O que nos motiva a sair de casa é o nosso compromisso com os pacientes, com a famílias e as vidas sob nossa responsabilidade. Precisamos nos manter de pé e continuar nossa missão”, afirmou.
A rotina de trabalho do médico Rodrigo Bezerra tem sido de 14 horas por dia. “Diferentemente de tecnocratas que estão vendo números gráficos, a gente que está na linha de frente, sabe que cada número de infectados e mortos tem rosto, tem história, tem família. A gente vê indivíduos entrando na UTI e a família se despedindo na entrada sem saber se eles vão sair”, contou.