Celebrado nesta quarta (20), o Dia Nacional da Consciência Negra foi abordado, em Plenário, pelas deputadas Simone Santana (PSB) e Juntas (PSOL), que enalteceram a data e endossaram a luta contra o racismo. Por sua vez, o deputado Joel da Harpa (PP) defendeu episódio ocorrido nessa terça (19), quando o deputado federal Coronel Tadeu (PSL-SP) quebrou uma imagem sobre o genocídio da população negra em exposição na Câmara dos Deputados.
A data foi escolhida por ser a ela atribuída a morte de Zumbi dos Palmares, em 1695. Primeira a falar sobre o tema, Simone Santana destacou a dupla importância deste dia por também marcar os 30 anos da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, ratificada na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) realizada em 1989. “A interseção entre essas duas bandeiras não é só uma coincidência: as crianças negras são as que mais têm direitos negados e violados no Brasil”, observou.
Para a parlamentar do PSB, o Dia da Consciência Negra é um reconhecimento à identidade, memória e ancestralidade dessa população. “Infelizmente, o racismo estrutural ainda é pulsante na negação de oportunidades a pessoa negras, que foram marginalizadas após a abolição formal da escravatura”, pontuou. “Daí a desigualdade abissal entre negros e brancos, testemunhada diariamente em todos os âmbitos da sociedade.”
Titular do mandato coletivo Juntas, Jô Cavalcanti iniciou o discurso repudiando a atitude do deputado federal que destruiu o quadro na exposição sobre o racismo. “É uma situação grave e a posição dele foi antidemocrática”, avaliou. “Hoje é uma data de luta. Não temos nada a comemorar neste País racista, onde ainda acontecem episódios como esse”, acredita.
A psolista citou dados para exemplificar a desigualdade em áreas como educação, saúde e emprego: “72% das mortes maternas são de mulheres negras. O Brasil é o quinto país no mundo que mais encarcera mulheres, e elas são negras. Pernambuco é o terceiro Estado com maior índice de aumento de homicídios de jovens e 70% deles são negros. Segundo a Oxfam Brasil, brancos e negros só terão salários iguais em 2089”, registrou. “Nunca houve verdadeira abolição porque ainda somos invisibilizados e temos nossos direitos tolhidos.”
Por outro lado, a deputada defende a valorização da produção intelectual do povo negro, citando, como exemplos, o engenheiro André Rebouças, a escritora Maria Firmina dos Reis e o poeta pernambucano Solano Trindade. “Também a cultura afro-brasileira, da umbanda e do candomblé. Aproveito para saudar a companheira Beth de Oxum, guerreira que teve seu terreiro invadido e apedrejado muitas vezes”, disse, anunciando que o mandato protocolou projeto de resolução para promover um debate na Casa sobre a situação da população negra.
Em contrapartida, Joel da Harpa apoiou a atitude do Coronel Tadeu. “Também sou policial militar e negro, e o fato em Brasília foi de um policial que se incomodou com um quadro que criminalizava a corporação. Sempre houve essa tentativa por parte dos grupos de esquerda, principalmente de ativistas”, comentou. “Na polícia, o que mais tem é negro. Nós vivemos num país multicultural, existem pessoas brancas, negras e pardas, mas todos somos brasileiros e não podemos nos vitimizar.”
Segundo o deputado, a imagem mostrava um negro no chão e um policial apontando uma arma para ele, como se fosse matá-lo. “Não é o que acontece no dia a dia do PM, que executa um trabalho ostensivo e preventivo, mas carrega uma arma de fogo para sua legítima defesa e a dos outros. O agente tem o direito constitucional de usá-la”, complementou o progressista. “Vivemos uma guerra urbana, e o policial não pode ser culpado por tudo que acontece nas comunidades.”
O parlamentar lembrou que os agentes de segurança pública também são vítimas de questões sociais e da ausência de investimentos. “Ninguém está pregando a morte de negros, e sim o civismo, a vida, os direitos garantidos, a defesa dos menos favorecidos. Mas não podemos acusar toda a instituição, que tem um excelente trabalho ao longo da sua história, prestando serviço à sociedade brasileira”, salientou. “Fica nossa indignação com relação ao quadro e nosso apoio ao deputado. Se estivesse lá, faria o mesmo.”
Tanto Jô Cavalcanti como Joel da Harpa retornaram à tribuna no tempo dedicado à Explicação Pessoal. “Respeito todo trabalhador, inclusive o da PM. Mas, infelizmente, quem mais morre no Brasil é o negro. Só no Rio de Janeiro, foram 12 crianças baleadas, nove delas mortas. Não estou querendo criminalizar ninguém, mas é o que acontece”, acrescentou a mandatária das Juntas. “Mesmo quando o policial mata, não se pode responsabilizá-lo, porque está defendendo, acima de tudo, a sua vida, que é um bem maior. Seja branco, negro ou de qualquer cor, se o bandido está ali trocando bala, ele tem que usar a arma”, respondeu Joel.
Também fizeram menções ao Dia da Consciência Negra os deputados João Paulo (PCdoB), Alberto Feitosa (SD) e Isaltino Nascimento (PSB). “É um marco na luta política de todos os afrodescendentes, que foram explorados e escravizados. A sociedade brasileira é fruto disso”, observou o comunista, e prosseguiu: “Os que estão morrendo assassinados e não têm direito a saúde e emprego são, em sua maioria, afrodescendentes. É um dia de luta para lembrar Ganga-Zumba, Zumbi, Dandara e outras lideranças que deram a vida pelo direito à liberdade.”
Seminário – Simone Santana aproveitou o pronunciamento para convidar os colegas a participarem do Seminário 30 anos da Convenção sobre os Direitos da Criança, a ser realizado pela Alepe em parceria com o Unicef. O evento será na próxima quarta (27), às 8h30, no auditório Sérgio Guerra. “Esse documento redimensiona a criança, passando a considerá-la sujeito de direitos. Também fundamentou o ECA ( Estatuto da Criança e do Adolescente), que permitiu sucessivos avanços na garantia de direitos a meninos e meninas”, explicou a deputada.
No encontro, serão apresentadas as demandas do Conselho das Crianças de Pernambuco, compiladas pela Frente Parlamentar da Primeira Infância com o apoio da Consultoria Legislativa (Consuleg). “Vamos divulgar dados preliminares sobre os direitos das crianças de 0 a 6 anos em Pernambuco, com um panorama de todos os municípios”, informou a socialista, que coordena o colegiado temático. “Contamos com a participação de todas e todos.”