O governo de Pernambuco descumpriu regras fiscais basilares da administração pública ao debitar, em dezembro de 2018, R$ 167,8 milhões de empréstimo da Caixa, específico para investimentos, da conta corrente criada unicamente para movimentar os pagamentos decorrentes do plano de ações e obras no âmbito das Despesas de Capital fruto do contrato de financiamento denominado “Finisa II”. As informações foram levantadas pelo gabinete da deputada estadual Priscila Krause (DEM), que levou o assunto à tribuna da Assembleia Legislativa na tarde desta segunda-feira (30). De acordo com a parlamentar, que já solicitou ao Ministério Público Federal (MPF), Tribunal de Contas da União (TCU) e Ministério Público de Contas Estadual (MPCO-PE) a tomada das medidas cabíveis para corrigir as irregularidades, os dados vieram à tona após ter identificada a baixa execução de investimentos do Executivo estadual nos dois primeiros quadrimestres do ano: apenas 3,31% dos dispêndios efetuados pelo governo estadual nesse período destinaram-se a investimentos – incluídas as inversões financeiras.
De acordo com Priscila Krause, o ritmo mais lento dos investimentos públicos financiados pelo governo de Pernambuco nesses oito primeiros meses do ano – o mais baixo dos últimos vinte anos – vai de encontro à liberação, pela Caixa, em 14 de dezembro de 2018, de R$ 167,8 milhões, referentes à primeira parcela do financiamento de R$ 340 milhões contratados para realizar exclusivamente investimentos de infraestrutura e saneamento. Ao se aprofundar nos dados, a parlamentar detectou que a totalidade do valor da primeira parcela foi debitado da conta específica para movimentação dos recursos do financiamento exatamente no mesmo dia em que foi liberado. O contrato do empréstimo determina que o “crédito aberto se destina única e exclusivamente, à aplicação em Despesas de Capital previstas na legislação orçamentária e discriminadas no Anexo I” e que “os recursos serão creditados na conta vinculada aberta na agência Caixa, cujos recursos destinam-se, obrigatoriamente, ao pagamento dos faturamentos dos projetos/ações constantes dos documentos de solicitação de desenvolvimento apresentados pelo governo de PE, vedada a utilização desses recursos para qualquer outro fim que não a execução dos projetos/ações”.
Além de apurar que a totalidade do valor repassado na primeira parcela foi debitado da conta criada especificamente para movimentar os recursos do Finisa II – sem qualquer vinculação com a realização de obras e ações de investimento -, Priscila Krause alerta que a própria execução orçamentária do governo estadual – acompanhado online pelo site Tome Conta, do TCE – registra que até 30 de junho, mais de seis meses após a liberação dos recursos, apenas R$ 9,8 milhões – ou 5,85% da totalidade – haviam sido gastos a partir dessa fonte de recursos específica. No mesmo mês, o governo firmou junto à Caixa o primeiro termo aditivo ao contrato, acrescentando aos projetos e ações aptos a utilizarem os valores do empréstimo quinze outras rubricas. Até dez de setembro, já considerados os novos projetos e ações incluídos posteriormente, a execução alcançava 31,9% (R$ 53,5 milhões), dos quais R$ 43 milhões (ou 25%) foram efetivamente pagos. “Não faz sentido o governo solicitar o repasse de metade do valor do empréstimo afirmando que as licitações e os contratos das obras já estavam assinados e passar seis meses gastando um valor mínimo do que foi efetivamente disponibilizado. Por outro lado temos a informação, comprovada no extrato bancário, de que a totalidade dos recursos foi debitado da conta exatamente num período de fechamento das contas do ano”, questionou.
Considerando que apenas 25% dos recursos disponibilizados foram efetivamente gastos em projetos e ações listados nas despesas de capital aptas a receber recursos do financiamento a pouco mais de dois meses do termo final do prazo contratual (14 de dezembro de 2019), chama atenção o fato de o governo já ter pago, desde dezembro, R$ 22,0 milhões à Caixa a título de amortização da dívida e pagamento de juros referentes ao contrato em questão. “O cenário é de um empréstimo que foi feito para colocar pra frente obras de infraestrutura importantes, como a Bacia do Fragoso, o Corredor Leste/Oeste, a Via Metropolitana Norte, e na verdade, passados quase dez meses do depósito, apenas um quarto desse valor foi efetivamente gasto com esses investimentos. Por outro lado, a totalidade do recurso foi debitada da conta. É preciso uma explicação rápida, estamos falando da vida das pessoas afetadas com a não conclusão dessas importantes obras”, registrou. A parlamentar também registrou que o contrato de financiamento representa um dispêndio significativo aos cofres públicos por decorrência do custeio da dívida e dos juros cobrados. “Não faz sentido pegar o empréstimo, gastar com o serviço da dívida, com os juros, e só utilizar um quarto dos recursos. O quadro sugere que se utilizou a totalidade dos recursos para outro fim e agora estão correndo pra tentar contemplar o contrato”, afirmou.
Nos ofícios remetidos aos órgãos de controle e fiscalização, Priscila Krause afirmou que o reduzido nível de execução do contrato Finisa II e os dados levantados que apontam para a retirada dos R$ 167,8 milhões da conta específica do financiamento na Caixa Econômica revelam, além do descumprimento contratual com o banco, desrespeitos à Constituição Federal (Regra de Ouro), à Lei de Responsabilidade Fiscal e à Lei dos Crimes Contra o Sistema Financeiro Nacional. Para a parlamentar, no entanto, as consequências sociais da burla fiscal são as mais representativas politicamente. “A consequência disso tudo é um nível de investimento baixíssimo e a maior lentidão na entrega de obras que são fundamentais para Pernambuco. Não é possível que se tenha o recurso e, por conta desse malabarismo para fechar as contas, se penalize mais uma vez os mais necessitados”, registrou.