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Da ‘carta branca’ ao ‘quem manda sou eu’: o que mudou na relação de Bolsonaro e Moro

Por Jornal Nacional — Brasília

O presidente Jair Bolsonaro reafirmou neste sábado (24) o que tem dito nos últimos dias sobre o ministro da Justiça, Sergio Moro. Bolsonaro voltou a dizer que ele é o presidente e que ele pode vetar “qualquer coisa” que Moro fizer.

As declarações de Bolsonaro contrariam o que o presidente garantiu no ano passado quando comunicou a escolha de Sergio Moro para o ministério. Ainda em 2018, Bolsonaro disse que o futuro ministro teria “carta branca” para nomear e conduzir ações de combate ao crime organizado e à corrupção.

Procurado, Sergio Moro disse em nota que “o compromisso com o presidente Jair Bolsonaro de enfrentamento à corrupção e ao crime organizado permanece igual ao assumido no 01/11/2018 sem qualquer alteração”.

Na manhã deste sábado, Bolsonaro foi questionado sobre o cumprimento de uma promessa feita quando convidou o então juiz Sergio Moro para assumir o Ministério da Justiça, em novembro do ano passado. Na ocasião, o recém-eleito Jair Bolsonaro disse que Moro teria “liberdade total” para comandar o ministério no combate à corrupção e ao crime organizado. Neste sábado, disse novamente que Moro precisa se submeter a ele.

“Ele ainda tem carta branca?”, indaga um jornalista a Bolsonaro.

“Olha, [tem] carta branca, e eu tenho poder de veto em qualquer coisa, senão, eu não sou presidente. Todos os ministros têm essa ingerência minha e eu fui eleito para mudar. Ponto final”, respondeu o presidente.

A “carta branca”, autonomia para tocar o ministério, foi o argumento usado por Bolsonaro em novembro do ano passado para convencer o então juiz Sergio Moro a deixar 22 anos de carreira na magistratura.

“Conversamos por uns 40 minutos. Ele expôs, logicamente, o que ele pretende fazer caso seja ministro. Eu concordei com 100% do que ele propôs, não é? Ele queria uma liberdade total para combater a corrupção e o crime organizado e um ministério com poderes para tal. Eu até adiantei: quem sabe uma fração do Coaf dentro do Ministério da Justiça? A questão da segurança ir para a Justiça nós já tínhamos decidido, bem como as nomeações. Ele tem ampla liberdade para realmente exercer o teu trabalho lá”, disse o presidente no ano passado.

No dia 4 de dezembro do ano passado, ainda durante a montagem do novo governo, o então presidente eleito Jair Bolsonaro garantiu autonomia a Moro para escolher inclusive o segundo e o terceiro escalões do Ministério da Justiça.

“O ministro Moro, como os outros, tem total liberdade pra escolher todo o seu primeiro, segundo, terceiro escalão”, declarou Bolsonaro à época.

Assim, Sergio Moro indicou Maurício Valeixo, com quem trabalhou durante a Operação Lava Jato, diretor-geral da Polícia Federal. Juntos, os dois passaram a escolher os superintendentes da PF. Mas o que era “liberdade total” virou interferência sistemática. No último dia 16, sem o conhecimento da cúpula da Polícia Federal, Bolsonaro anunciou a troca do superintendente do Rio de Janeiro.

“O que eu fiquei sabendo: se ele resolveu mudar, vai ter que falar comigo. Quem manda sou eu. Deixar bem claro. Eu dou liberdade para os ministros todos. Mas quem manda sou eu”, disse Bolsonaro.

Diante da reação negativa na Polícia Federal, com ameaça até de entrega de cargos, o presidente recuou momentaneamente. Mas, na última quinta-feira, Bolsonaro foi além e ameaçou trocar o diretor da Polícia Federal.

“Ele pode, o Valeixo pode querer sair hoje, não depende da vontade dele. E outra: ele é subordinado a mim, não ao ministro, deixar bem claro isso aí. Eu é que indico, está na lei, o diretor-geral. Agora, uma onda terrível sobre superintendência, 11 foram trocados, ninguém falou nada. Quando eu sugiro um cara de um estado para ir para lá, ‘está interferindo’. Espera aí. Se eu não posso trocar um superintendente, eu vou trocar o diretor-geral, não se discute isso aí”, afirmou o presidente.

Nesta sexta (23), a Associação Nacional dos Delegados da Polícia Federal divulgou uma carta em defesa da autonomia da instituição.

Os delegados afirmam que o presidente tem prerrogativa de indicar o diretor da PF e que respeitam a autoridade dele, mas “a Polícia Federal não deve ficar sujeita a declarações polêmicas em meio a demonstrações de força que possam suscitar instabilidades em um órgão de imensa relevância, cujos integrantes são técnicos, sérios, responsáveis, e conhecedores de sua missão institucional”.

A carta dos delegados é uma reação contra o que consideram “pressões e tentativas de intervenção” na Polícia Federal.

O presidente passou por cima da autoridade do ministro Sergio Moro em outras ocasiões. Bolsonaro ignorou sugestões feitas pelo ministro da Justiça para o decreto das armas e revogou a indicação de uma suplente para o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária.

Bolsonaro interferiu até no Coaf, transferido para o Banco Central. O episódio levou à queda de um dos principais aliados de Moro na Lava Jato, o auditor Roberto Leonel, demitido da presidência do conselho, que passou a se chamar Unidade de Inteligência Financeira.

O jornal “O Globo” destaca que “o abalo da relação entre os dois começou a crescer há quase um mês, quando Moro foi ao presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, pedir que ele fizesse uma revisão da decisão em que restringiu o compartilhamento de relatórios do antigo Coaf com os ministérios públicos e a Polícia Federal. O movimento do ministro irritou o presidente Jair Bolsonaro.”

A decisão liminar dada por Toffoli atendeu a um pedido da defesa do senador Flavio Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente. O plenário do STF ainda vai analisar a liminar.

Um relatório do Coaf apontou movimentações atípicas de Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. A defesa argumentou que dados dessas movimentações foram repassados ao Ministério Público sem a autorização judicial.


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