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AS FLORES DO SERTÃO

FOTO: JÚNIOR FINFA
 PREFEITA SANDRA E SEU ESPOSA ARNALDO NOVAES – FOTO: JÚNIOR FINFA

O pequeno município de Calumbi, que elegeu uma prefeita e mais cinco vereadoras, tem a maior representatividade feminina do Nordeste percentualmente no Legislativo

Por: Aline Moura – Diario de Pernambuco

Localizado no Sertão do Pajeú, a 360 quilômetros do Recife, Calumbi vive sua pequena revolução quando se fala em política. A partir de 1º de janeiro de 2017, a cidade terá a maior representatividade feminina do Nordeste, em termos proporcionais, ao lado de Amapá do Maranhão (MA) e Olho D’Água dos Borges (RN). Um mês depois de a primeira mulher presidente sofrer um impeachment – a petista Dilma Rousseff -, a maioria dos 6,6 mil eleitores da cidade optou por dar mais um voto de confiança ao PT e a uma mulher. Escolheram Sandra da Farmácia (PT) para governar o município e elegeram mais cinco candidatos do sexo feminino para a Câmara Municipal, de um total de nove vagas (55,5%).

O resultado eleitoral em Calumbi é inédito, considerando que a política nordestina ainda é marcada pela cultura do machismo. Se considerarmos que Calumbi fica no Sertão pernambucano e 70% da população mora na zona rural, o percentual de 55,5% de vereadoras eleitas e mais uma prefeita é inovador. Num levantamento realizado pelo Diário no Nordeste e em municípios que serão governados por mulheres – 287 ao todo -, Pernambuco apareceu em, entre os nove estados, em oitavo lugar no ranking, quando se tirou a média do número de prefeitas e vereadoras eleitas. Portanto, a vitória de seis mulheres em Calumbi foi uma mudança de rumo. Não é fácil para o sexo feminino fazer política num dos poucos estados brasileiros que nunca elegeu uma governadora ou prefeita de capital. Em pouco mais de uma década, 2016 foi o ano que mais mulheres se elegeram em Pernambuco, porém a proporção ainda é menor que outros do Nordeste.

Para entender um pouco a revolução feminina em Calumbi é preciso entender que a cidade, com população de cerca de dez mil habitantes, nunca teve uma política previsível. O primeiro prefeito da cidade, Manoel Belarmino de Souza, foi nomeado pelo então governador Miguel Arraes, em fevereiro de 1964, mas ele só tomou posse em 1º de abril daquele ano, no mesmo dia em que Arraes estava sendo preso para ser deposto do cargo pelo golpe militar. Em 2010, o município sertanejo deu 94% dos votos a Dilma Rousseff para presidente, a maior votação do Brasil, em termos proporcionais. Agora, com a vitória dessas seis mulheres e de Sandra da Farmácia, que é petista, numa época em que o PT anda em baixa, é de surpreender.

Ao contrário de outras mulheres que concorreram a um mandato, neste ano, no estado e tiveram a campanha esvaziada, ela conta que não sofreu preconceito em momento algum durante a disputa municipal, na qual alcançou 2.829 votos (52%). Calumbi viveu uma eleição acirrada, aliás, onde a mulher era o foco. Sua adversária foi Aline Cordeiro (PSB), que conquistou 2.231 votos, 598 a menos que Sandra. A socialista ajudou a eleger três vereadoras; Sandra, duas, com a vantagem de ter vencido a disputa no final. “Sou comerciante e muito comunicativa. Eu não pensava em política, mas entrei com toda garra e botaram meu nome de todo jeito”, contou.

A prefeita eleita diz estar preocupada com a política de terra arrasada do atual gestor, Erivaldo José da Silva (PSB), que, segundo ela, não tem pago salários em dia e sucateado a saúde, prejudicando grande parte da população, que mora na zona rural. “Não tem água na maternidade, isso é um absurdo”, disse ela.

De acordo com dados fornecidos pela prefeitura ao Tesouro Nacional, havia uma dotação de R$ 4 milhões para saúde, mas até o quinto bimestre só havia sido gasto um pouco mais da metade, R$ 2,7 milhões. Isso sem falar que a folha de pessoal está inchada, comprometendo 58% da receita do município. Será um desafio para a prefeita eleita, especialmente porque o principal propulsor econômico de Calumbi vem da agricultura. Os dados do Índice de Desenvolvimento Firjan de 2015 revelam que a cidade tem um baixo desenvolvimento de emprego e renda, estando na 165ª posição no ranking estadual, um lugar nada positivo.

Sandra é filha de uma família de classe média e tem mais seis irmãos. O pai era carteiro, a mãe, dona de casa. Ela formou-se em geografia, trabalhou no Banorte, que fechou no plano Collor, em 1992, e resolveu abrir uma farmácia em Calumbi. Em 2009, decidiu se filiar ao PT por simpatia, sendo convidada neste ano a disputar o cargo de prefeita.

“Não sofri preconceito. Minha campanha foi muito bonita, o pessoal abraçou mesmo”, contou. Segundo a prefeita eleita, no dia 15 de agosto, no meio da eleição, ela precisou ser internada e passar por uma cirurgia, na qual colocou três pontes de safena. “Fiquei 12 dias na UTI, mas as pessoas chegavam e me diziam: ‘não se preocupe. Vamos fazer a campanha por você’”, disse ela, emocionada. “Fiz apenas 15 dias de campanha, mas a cidade queria mudanças”, declarou a petista. “Calumbi vai voltar a sorrir a partir do próximo ano. Vamos mostrar a força das mulheres”.


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